Neste episódio Nicole Puzzi entrevista Monique Prada, garota de programa e militante pelos direitos das prostitutas. No episódio 17 da terceira temporada de Pornolândia elas conversam sobre a regulamentação da prostituição, direitos às garotas de programas e preconceito. Uma conversa que você poderá ler na transcrição a seguir, ou assistir diretamente no Canal Brasil na Globoplay.
Nicole Puzzi: Ela é uma mulher engajada na luta política pelos direitos das prostitutas. E ela vai nos contar hoje os principais desafios da tão falada, mas pouco discutida profissão. Monique Prada fala com propriedade, pois ela é garota de programa e sente na pele os efeitos do preconceito mais antigo do mundo. E, logo depois, sem nenhum preconceito, a nossa Xgirl.
Beneficiados pela proibição
Monique, quem se beneficia com a proibição da prostituição?
Monique Prada: Então, Nicole, sempre que uma coisa é proibida ou penalizada, alguém ganha com isso. Não é estranho que em cada esquina tenha um puteiro, apesar de serem proibidos. Quem se beneficia são as pessoas que cobram propina, são aqueles que estão por trás.
NP: É uma hipocrisia, né. Porque é proibida a prostituição, mas ela continua acontecendo.
Monique Prada: A prostituição, na verdade, não é proibida no Brasil. O que são proibidas são as casas. Mas, as casas são justamente os templos do patriarcado, instituição muito concreta, muito firme e muito bem vista, inclusive. Acho que as cafetinas são muito mais bem vistas do que as prostitutas.
NP: É mesmo?
MP: Parece isso. Por exemplo, o Oscar Maroni fala tranquilamente do trabalho dele e olha onde ele está.
Monique Prada fala sobre o interesse de criminalização da prostituição
NP: É verdade. Sabe, onde existe poder, existe prostituição. E nesse locais onde se tem muito poder que parece haver pouco interesse em cuidar desta parte da prostituição, regularizar o trabalho das prostitutas.
MP: Não sei se tem pouco interesse em regularizar, é um interesse mesmo em criminalizar e deixar as coisas embaixo do tapete.
NP: Por que?
MP: Primeiro, pelo óbvio: não dá voto. E, segundo, que isso acaba ameaçando a família tradicional. Enquanto nós estamos em um gueto, às escondidas, não atrapalha ninguém. Mas, se a gente começa a sentar nos mesmo lugares, nas mesmas mesas onde eles estão, isso gera desconforto para todo mundo. São coisas que devem ficar embaixo do tapete.
Discussão no Congresso
NP: Como está esta discussão no Congresso? A questão da prostituição e legalização dos locais de prostituição, o que é que está acontecendo?
MP: Então, no Congresso, nós temos dois projetos de regulamentação da prostituição. São eles o PL42112012, conhecido como Gabriela Leite.
NP: Do que se trata?
MP: O PL Gabriela Leite foi proposto pelo Deputado Jean Wyllys e foi construído junto com a Rede Brasileira de Prostitutas. Ele visa regulamentar os locais de trabalho, prevê aposentadoria especial depois de 25 anos de trabalho e a possibilidade de cooperativas. Então, esse é o PL que nós defendemos. Temos algumas críticas, mas esse PL nós defendemos.
NP: Quem foi Gabriela Leite?
MP: Gabriela Leite foi a fundadora da Rede Brasileira de Prostitutas. Ela faleceu há pouco mais de dois anos, fundou a rede junto com Lourdes Barreto aqui e é a matriarca do movimento de prostitutas no Brasil.
A glamourização das prostitutas segundo Monique Prada
NP: Essa glamourização das prostitutas através de filmes, filmes estrelados por celebridades, você acha que isso atrapalha ou ajuda na valorização do trabalho das prostitutas comuns, daquela prostituta que tem uma vida precária, que luta para conseguir alguma coisa e não tem apoio nenhum do Estado?
MP: Sabe, Nicole, eu tenho pensado muito nisso. Eu já publiquei alguns textos “A glamourização da prostituição nos atrapalha”. Mas, eventualmente, não é que ela nos atrapalhe. Essas mulheres que estão na profissão, chamadas de luxo, elas também precisam se aliar a nós para que a gente consiga ter uma luta mais ampla e mais poderosa. E nós sabemos, muitas vezes trabalhei em falt, a gente coloca uma coisa sedutora no site, mas a vida real pesa se a gente está sozinha.
Então, a glamourização em si atrapalha por uma via indireta, mas ela é inevitável. Faz parte do vender o trabalho você se mostrar como alguém que venceu, que é mais bonita, que atende melhor, enfim. Então, ela não chega mais a atrapalhar, às vezes pode servir até de exemplo para quem está trabalhando de modo mais precário. Para que você se empodere, para dizer “eu posso trabalhar melhor, eu posso exigir mais do meu cliente, eu posso tudo”.
O mundo sem prostituição na visão de Monique Prada
NP: E na sua visão, como seria o mundo em que a prostituição seja legalizada?
MP: As mulheres poderiam cobrar por seus direitos às casas e, quem sabe com algum tempo de regulamentação, o estigma fosse esmaecendo. O principal no primeiro momento em que se vê a anistia internacional recomenda a descriminalização total de todas as pontas de prostituição, não é só legalizar as prostitutas. A anistia recomenda isso como uma questão de diminuir a violência contra a mulheres prostitutas, porque elas também são mulheres.
NP: São as maiores vítimas, né.
MP: Na verdade, a sociedade tem a prostituição como violência em sim, mas isso não é verdade. Existe violência dentro da prostituição, mas não é só violência. E a gente precisa combater a violência, então a anistia recomenda isso como forma de combater a violência. A Organização Mundial da Saúde recomenda isso como uma maneira de conter a transmissão de HIV e outras doenças. Digo isso porque, em outros países, não é o caso do Brasil, você carregar camisinha na bolsa é considerado prova de prostituição. Por exemplo, nos Estados Unidos.
As leis e o mercado da prostituição
NP: É curioso porque fala-se prostituta como se fosse uma opção somente da mulher. A opção de prostituta é uma opção do homem também. Porque, se esses homens que falam tanto das prostitutas não tivessem essa busca pelas prostitutas eles se tornam também prostitutos, porque eles estão em busca das prostitutas. Não aconteceria nada.
MP: Se não houvesse mercado, não haveria prostituição, em certo sentido. Existem leis que tentar coibir esse mercado, leis que eu chamo de “leis para educar o marido infiel”. A Suécia é precursora neste tipo de lei. Ela implantou em 1999, faz um bom tempo, uma lei que proíbe homens de contratarem prostitutas. Em 2016, ainda temos prostitutas na Suécia. A questão, qual é? Não é uma luta contra a prostituição, é para esconder. A prostituição pode acontecer, ela só não pode ser vista.
NP: Ah, eu não entendo, porque isso é fiscalizar o sexo alheio, né. São fiscais de bussa, né. Que absurdo! Bom, enfim.
MP: É uma lei que preserva a família intacta.
Proteção à família
NP: Que família?
MP: A família tradicional. Você não pode usar leis para cuidar do seu marido. Embora essa lei tente coibir a violência contra as prostitutas, ela não serve para isso. Ela tanto não serve para isso, que na Suécia, se você é pega por prostituição, você é legalmente uma pessoa incapaz, não pode criar filhos, você perde a guarda e ão pode um monte de coisa. Então, essa lei não protege mulheres, essa é uma lei que protege a família tradicional. Coíbem coisas que a lei não deveria coibir, quem tem que decidir qual é a sua relação é você e seu marido.
Encontre Monique Prada
NP: E como que as pessoas fazem para te encontrar?
MP: Para me encontrar, é muito fácil me achar no Twitter, @moniqueprada. E nós temos um projeto camdo Mundo Invisível, que visa cobrir a questão da prostituição ao redor do mundo. Tem muitos conteúdos próprios, tem matéria minha e de outras colaboradoras e colaboradores. Tem bastante material traduzido para quem se interessa por legislação fora daqui. A partir do ponto de vista de prostitutas, nós temos uma rede bem grande, a gente faz traduções e um intercâmbio bem grande de informações. É mundoinvisivel.org. É bem importante e bem legal.
NP: Amor, muito obrigada!
MP: Eu que te agradeço. Foi muito bom!
NP: Foi bom demais. E agora, se você quiser assistir uma mulher maravilhosa, fica com a gente e a nossa xgirl.
A nossa Xgirl
E o programa terminou com a maravilhosa Xgirl Mia Cherry, uma morena tatuada linda e gostosa, que ficou nua em um ensaio sensual que revela o prazer de tirar a roupa e a beleza da nudez.
