Eliane Dias no Pornolândia

Neste episódio Nicole Puzzi entrevista Eliane Dias, CEO da Boogie Naipe. No episódio 26 da terceira temporada de Pornolândia eles conversam sobre o machismo no ambiente do rap, a situação das mulheres na periferia e as mulheres no mercado de trabalho. Uma conversa feminista que você poderá ler na transcrição a seguir, ou assistir diretamente no Canal Brasil na Globoplay.

Nicole Puzzi entrevista Eliane Dias, CEO da Boggie Naipe.

Nicole Puzzi: Ela cresceu na periferia e enfrentou muitas das dificuldades que mulheres brasileiras, negras e pobres enfrentam. Hoje ela é uma das mulheres mais influentes no rap nacional. A frente da produtora Boogie Naipe é responsável pelo grupo Racionais MC’s. E depois, sem nenhum preconceito a nossa Xgirl.

Eliane Dias e os meninos

Eliane, como era a sua infância com os meninos?

Eliane Dias: Sempre foi maravilhosa, sempre tive boa relação com os meninos! Sempre foi uma relação de brincadeira, de muito respeito e tudo que eles faziam eu fazia também.

NP: E você cresceu assim, se sentindo igual aos meninos. E qual foi o momento que você percebeu que se você fosse homem você teria menos dificuldades?

Eliane Dias: Na verdade, eu nunca me achei igual aos meninos, não. Eu me colocava na posição de igual e me fazia respeitada como tal. Mas, igual eu nunca me achei não!

NP: Você é mulher de um rapper e você trabalha no meio do rap.

Eliane Dias: sim!

Eliane Dias e o ambiente do rap

NP: Deve ser muito estranho, porque deve ter muito homem ainda que é troglodita que não acredita no feminismo e que não valoriza a mulher. Como é esse ambiente que você vive?

ED: É muito difícil, ainda é difícil. Os homens não entendem o feminismo e não querem entender. Os poucos que entendem, ainda vão dizer, em algum momento, dizer que é mimimi ou frescura… os poucos que querem entender. E no mundo do rap é pior ainda. No começo, quando eu comecei a trabalhar com o Racionais era mais difícil e agora se torna… eles me aceitam, porque eu procuro dar o máximo em tudo o que eu faço, eu procuro ser extremamente eficiente. Ainda tenho muito o que aprender, ainda não sei muito coisa. Em outras coisas eu me imponho, falo mais alto e, em outras, eu atropelo mesmo. Eu vou lá, faço e está feito. Mas, eu tenho um enfrentamento muito grande ainda.

As mulheres no rap

NP: Agora está começando a ter muitas mulheres no rap. Então, você acha que vai ter alguma mudança ainda nos próximos anos com a entrada das mulheres?

ED: Já tem! Eu percebo que as mulheres estão chegando e marcando seu território, elas estão chegando e chegando de cabeça erguida. Elas estão chegando sem precisar se apoiar em nenhum rapper. No passado, no começo, eu via muitas mulheres se apoiando nos homens para dar uma alavancada na carreira. E hoje, não. Tem muitas mulheres que chegam assim “sou eu, vou entrar de cabeça erguida pela porta da frente e, se eu conquistar, a vitória é minha e não foi porque eu me apoiei no rapper”. Então, está melhorando e já melhorou muito. No começo, no passado, tinha um conflito: as mulheres copiavam muito a questão do homem, não sabiam se vestiam como homem, se vestiam como mulher, se usava maquiagem, se não usava. E hoje, não, elas possuem sua própria identidade.

Projeto Plano de Menina

Eliane Dias e Nicole Puzzi conversando sobre Plano de Menina

NP: Nós estamos vendo, hoje em dia, cada vez mais jovens com uma sexualidade precoce, precoce demais, não é? E eles estão se envolvendo com um lado perigoso na periferia, mas também fora da periferia, mas especialmente lá onde elas são desamparadas, às vezes elas acham que devem usar a beleza delas. Às vezes elas se atropelam todas, elas mesmas provocam danos à sexualidade delas. Como é que você encara isso? Qual a sua preocupação com isso?

ED: Olha, eu tenho grande preocupação com isso. Eu gostaria muito que as meninas entendessem que o corpo… ela é livre para fazer o que quiser, mas ela não tem obrigação de fazer isso. Eu queria muito que as meninas entendessem que elas são livres para ter relações sexuais com quem quiserem, mas não têm essa obrigação.

Eu faço parte de um projeto chamado “Plano de Menina” e esse projeto vai continuar por cinco anos e a gente tem a pretenção de orientar 100 meninas por ano. Todos os sábados tem uma orientadora que vai conversar com essas meninas, aí acaba que a gente um sábado por mês. Neste Plano de Menina eu ouvi depoimentos de meninas que vão com o menino só para ele parar de encher o saco. Eu fiquei assim “não é possível que eu estou ouvindo isso!”. Ela falou para mim “às vezes eu transo com o menino só para ele parar de encher o saco”. Isso é um sofrimento.

Violência

NP: Isso é um violência!

ED: Isso é uma violência contra ela mesma. Então, o que a gente pode fazer por hora, a gente está fazendo. A gente tem esse Plano de Menina, que não é idealizado por mim, é idealizado pela Viviane que é uma jornalista. Ela juntou um grupo de mulheres de porte, fortes, mulheres em resolvidas nos negócios, trabalham com grandes marcas. A gente faz esse trabalho e o trabalho começa justamente com o que a gente quer mostrar.

A mulher na pornografia e prostituição segundo Eliane Dias

Eliane Dias com uma camisa vermelha, o braço apoiado em uma janela.

NP: Como é que você vê a questão da mulher na pornografia e na prostituição?

ED: Olha, eu acho completamente natural. São escolhas e a prostituição é uma escolha, às vezes é uma opção, é uma necessidade. E eu acho absolutamente natural, eu acho necessário até. Ela que decide, não tem problema algum. Tenho amigas… colegas que são prostitutas, que fazem filme pornô e são mulheres absolutamente normais. Acho até que elas têm um plus a mais.

NP: Se ela não está sendo obrigada, eu acho que… Se ela é maior de idade e não está sendo obrigada a fazer, eu acho que a vida é dela.

Os conflitos

Você, à frente de um grupo de homens, lidando com todos os gêneros, quais são os conflitos que ainda persistem?

ED: Acho que o maior conflito para a mulher hoje no rap ou fora dele, é provar sua capacidade. Ainda existem muitas dúvidas sobre a capacidade da mulher. E, na questão do rap, eu ainda tenho esse enfrentamento. E fazer valer aquilo que eu estou pedindo, se eu estou mandando fazer tal coisa, para eu fazer aquilo valer é muito difícil. Se eu fosse um homem, eu teria mais credibilidade? Se eu fosse uma mulher branca, eu teria mais credibilidade? Se eu falasse assim para eles “hoje é dia 17, hoje é dia 20, eu preciso que você entregue isso dia 25′. se eu fosse um homem, uma mulher branca ele estaria com aquela música ali no dia 25? Porque, eles nunca respeitam o meu prazo.

Uma dica de Eliene Dias

NP: Agora eu queria que você desse uma dica para as mulheres que precisam trabalhar com os homens, em ambientes dominados por homens e elas querem colocar a personalidade delas, fazer trabalho delas e que às vezes aquele ambiente dominado por homens não permite.

ED: Olha, é difícil mesmo. A gente tem que ter… A gente tem que colocar a nossa feminilidade na frente. Não dá para deixar de ser mulher, de ter a sua intuição feminina e trabalhar com homens. Não dá. A gente tem que colocar a nossa intuição, a nossa feminilidade, a nossa garra, a nossa braveza para poder ver um ambiente e saber que neste ambiente eu vou bater pesado. Neste ambiente aqui eu vou ouvir e depois eu vou dar a minha posição. Neste ambiente aqui eu nem vou ouvir, vou sair andando.

Então, a gente precisa ter o nosso time feminino, eu tenho muito disso. Às vezes eu falo assim “olha, eu não vou me desgastar com ele, porque não vale a pena”. Em determinados lugares eu falo “aqui vai ser do jeito que eu quero” e em outros eu falo “vou prestar atenção, vou ver e aprender, porque às vezes tem coisas boas também”. Os homens também tem coisas boas que podem nos passar, vou olhar e vou aprender e, se tiver algumas coisa boa, eu levo comigo.Se não tiver eu deixo ali mesmo.

NP: Ah, eu adorei você. Muito obrigada, viu!

ED: Eu que agradeço!

NP: Nossas portas estão abertas para você!

ED: Obrigada!

NP: E agora nós vamos ver uma mulher linda. Vocês vão adorar a nossa Xgirl.

A nossa Xgirl

Xgirl Luli RM

E este episódio termina com a maliciosa Xgirl Luli RM, uma tatuada que ficou nua em um ensaio cheio de sensualidade e prazeres.