Uma das responsáveis por um movimento de ação direta que usa o corpo e a pornografia para protestar e atacar a fatia reacionária da sociedade, Diana J. Torres explica, na entrevista a seguir, o PornoTerrorismo.
 

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1) Qual a diferença entre pornografia comercial e terrorista? Elas se tocam em algum ponto ou são coisas totalmente distintas e distantes?

Eu não chamaria de “pornografia terrorista”, chamaria de pós-pornô. Há muitas diferenças entre essas duas formas de representar o pornográfico: o feminismo, o DIY (Do it yourself ou faça você mesmo), a diversidade dos corpos e das práticas, a politização da criatividade, sexualidade e arte visual, o “queer” e a dissolução dos gêneros, etc.
A pornografia comercial carece de todos estes recursos, pois a sua função (embora pareça apenas um negócio, esta não é a origem da sua criação) é ser um dispositivo para controlar a nossa sexualidade, nosso gênero e nossas identidades.
Eu acho que o único ponto em comum, que esta começando a aparecer em algumas produções “mainstream”, é que estão começando a incluir práticas clássicas do Pós-Pornô (como a penetração anal de homens por mulheres), mas isso ainda acontece com pouca frequëncia.

2) Tem algum exemplo em que a pornografia foi usada como terrorismo e o objetivo do protesto tenha sido alcançado? E alguma ação pornoterrorista que tenha fracassado?

O Pornoterrorismo é mais do que um uso da pornografia para atacar inimigos. Na verdade, é um uso subversivo e agressivo da sexualidade. Houve algumas ações pornoterroristas muito bem sucedidas, como o assalto-porno na Basilica di San Pietro, no Vaticano, ou a masturbação coletiva em público. E é realmente muito difícil uma ação pornoterrorista fracassar, porque qualquer um que quebra as regras impostas sobre sexualidade e gênero passa a ser considerada uma pessoa “terrorista” para a sociedade.
Você pode fazer o teste: vá para a rua um dia e começe a foder sem roupas. Rapidamente haverá a sua volta um monte de gente apavorada, em estado de choque. Mostrar para as pessoas tudo o que o sistema esconde delas é sempre um ato terrorista.

3) Vc usa o seu corpo como base de projetos ligados a pornografia? Já usou? Pode citar alguns exemplos?

Meu corpo é o fundamental em todos os meus projetos “pornoterroristas”. Como Barbara Kruger disse em uma das suas melhores obras: “Seu corpo é um campo de batalha”. A pornografia que me interessa, é o Pós-Porn. Em todas as minhas performances o corpo está muito presente, eu fico nua, faço coisas sobre ele (penetração com agulhas, fisting) faço sons com meu corpo (uso um microfone vaginal para converter o corpo em um instrumento de percussão, intimamente ligado à prática de spanking).

E na minha poesia (ver Transfrontera1) e no meu livro, onde a maioria dos capítulos têm uma relação direta com o corpo.
Isto se deve a maioria das repressões contra as quais eu luto estarem relacionadas ao corpo, e ao controle do corpo.

4) Você conhece algum grupo que faz ou tenha feito ações pornoterroristas em galerias de arte? O terrorismo pode aproximar a pornografia da arte?

Em galerias de arte? Se é quase impossível introduzir o pornoterrorismo nos círculos das artes cênicas, nas universidades ou em qualquer espaço institucional, eu não acredito que o pós-pornô tenha muito futuro nas galerias de arte. A principal razão para isto é que é difícil vender o pornoterrorismo, pois é algo que não pode ser comercial, é algo muito marginal, periférico.
É possível que existam grupos que, no passado, tenham praticado atividades subversivas relacionados com o sexo nesses espaços, mas eu desconheço.
O pornoterrorismo é uma forma de arte, não posso negá-lo, mas é um tipo de arte inseparável do seu conteúdo político, arte usada como arma, como protesto.

4.1) Como a arte e o pornoterrorismo caminham no resto do mundo?

A verdade é que (o pornoterrorismo) não é algo grande o suficiente para se espalhar muito, pelo menos de forma aberta (porque na verdade o mundo está cheio de pornoterroristas, ainda que não se fale nisso).
No México há alguns artistas muito interessantes usando este conceito, no Chile existe um coletivo de “postporno” ligado a “Coordenadoria de dissidência Sexual” que eu classificaria sem dúvida como “pornoterrorista”, na Colômbia existe o grupo “La Fulminante“. E mais perto, aqui na Europa existem vários grupos ou indivíduos que usam a pornografia como uma arma: PostOp, VideoArmsIdea, GoFistFoundation, num nível mais teórica temos Llopis María (video abaixo), Tim Stüttgen, etc.

 

 

5) Você acha que pornografia e arte se encontram em algum momento? Classificar pornografia como arte é uma forma de torná-la mais fácil de ser assimilada? Qual o efeito disso?

Sim, eu acredito que a pornografia, como uma representação que é, pode ser considerado arte, porque a arte é basicamente isso: representações.
A questão é que eu não acho que a pornografia que não vai além do significado real do sexo, que não tem nada de político, seja artística; porque não há subjetividade, não há uma idéia que vá além da intenção comércial. Dizer que a pornografia mainstream é arte, é como dizer que uma fábrica de Coca-Cola também é arte.
Para mim é muito difícil separar a arte da política e toda a arte que não é capaz de transmitir uma idéia para mim é apenas lixo. Para mim, a arte é política, e a pornografia também pode ser se for entendida como uma crítica de si mesma.
Em sua segunda pergunta, na verdade eu acho que acontece exatamente o contrário: a arte (a arte política de que falo, a outra arte é desinteressantes para mim) é mais fácil de ser assimilada se o veículo que traz a mensagem estiver relacionado à sexualidade. Não necessariamente pornográfico, mas de alguma forma sexual. Eu sempre digo que apelar para o prazer das pessoas é uma boa maneira de mantê-las atentas e abertas para uma mensagem que vai além da sexual. Eu uso essa técnica e transmito as minhas idéias para as pessoas enquanto elas estão em um estado de excitação (mais sensíveis, mais vulneráveis), neste momento eu solto uma bomba.
O efeito disto é desconhecido para mim. Eu acho que minhas performances sempre conseguem comunicar algo, que ninguém vai indiferente casa depois de assistí-las, e eu acho que isso é em grande parte porque uma das minhas ferramentas é postpornografía, que ataca algo íntimo como a sexualidade.

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6) Qual sua opinião sobre a diferença entre pornografia e erotismo? Seria os “beijaços” gays por exemplo, exemplo de terrorismo erótico?

Annie Sprinkle diz que a diferença é apenas uma questão de iluminação… Eu acho que é realmente uma questão de medo e hipocrisia. Quem tem medo da representação sexual chama de erotismo, quem quer que um projeto pornográfico tenha o apoio do sistema o chama assim também. Estou cansada de me esconder, o erotismo é uma maneira de esconder as coisas. Acho que para uma pornografia de guerrilha, como o postporno ou pornoterrorismo, o erotismo é uma espécie de inimigo. Muitas pessoas dizem que a diferença básica é a representação explícita, mas para mim, qualquer representação da sexualidade é pornográfico, por mais sutil que seja, e nunca vou chamar de erotismo porque é uma forma de camuflagem que não beneficia em nada a liberdade sexual .
É claro que eu não acho que exista terrorismo erótico porque o erotismo é em si uma forma de despolitizar a representação da sexualidade e isso não é nada terrorista. Um “beijasso” entre pessoas do mesmo sexo pode ser muito terrorista de acordo com o contexto, mas você não pode usar a palavra “erótico” porque na verdade ele é um ato sexual. A subversão de duas pessoas do mesmo sexo se beijando é precisamente estar dizendo: “somos gays”, “fazemos sexo entre nós”.

7) Como vocês encaram o olhar do próximo em relação às ações porno terroristas? Por exemplo, alguém que não tem idéia de que trata-se de um protesto pode receber a informação da ação pornoterrorista como se fosse pornografia comercial, como você vê esta possibilidade?

Na verdade, eu sempre espero que esse olhar ultrapasse a fronteira da audiência e se converta também no olhar daquele que realiza a ação, mesmo que no papel de “voyeur”, que é tão aceitável quanto o papel de exibicionista. Eu também sou muito exibicionista e assim os olhares sempre me deixam excitada ainda que seja um olhar de asco, perplexidade ou vergonha. Acredito que uma das diferenças básicas entre o porno e o pós porno é que o pós porno convida de forma explicita a participação de todos, ele não está excluindo ninguém pelo seu gênero, nem pelo tamanho de seus genitais e nem pela forma do seu corpo. Por outro lado o porno comercial não tem nada de escândaloso, está totalmente adaptado ao sistema (é consumido em casa, é maxista, é hetero/homo patriarcal, etc) e uma das carcterísticas principais do porno terrorismo é romper a fronteira do público privado, de forma que você pode realizar uma ação sexual totalmente típica da pornografia comercial mas de forma descontextualizada, por exemplo fazer sexo na rua se transforma em um ato terrorista. O ato sexual nãos er feito no meio da rua é parte da estratégia da repressão sexual pro parte da igreja, do estado e da ciência médica.

8) Quais as ações mais divertidas que você ja viu? Pode mandar links do youtube ou vimeo para ilustrarmos esta entrevista?

Hahahaha, as ações são totalmente censuradas nesses meios que você citou e em todos os meios comerciais. Perdi quatro canais do youtube, o último só por mostrar peitos e no vimeo também não está permitido pornografia.
Mas te conto as ações terroristas mais divertidas. Uma foi um porno assalto ao vaticano, em Dezembro de 2008. Eu junto com o coletivo VideoArmsIdea (cediadas em Valencia – Espanha) e graças a brilhante ideia de uma delas, Chiara Schiavon, fomos ao vaticano totalmente disfarçadas, para parecermos autênticas devotas, levamos umas fitas onde havíamos gravado os sons de nossas trepadas: gritos, gemidos e tapas. Entramos separadas, eu e a Chiara com as fitas e as outras como turistas para gravar a ação. Colocamos os toca-fitas na Basílica de Sao Pedro, Chiara ficou atrás do altar da Virgem de Santo Socorro e eu no túmulo do Papa Pio VII. O meu toca fitas não sei porque não funcionou, mas o da Chiara sim, e durante um glorioso minuto a virgem comoçou a gemer. Durou muito pouco, mas foi espetacular, as pessoas que estavam em volta começaram a achar que um milagre estava acontecendo. Esta é uma ação muito simples, porque você aciona o toca fitas (deixando 5 minutos de silêncio no começo da fita) e sai. é muito bom atacar a igreja, ela é uma das instituições que mais tem feito mal a sexualidade das pessoas, merecem vingança.
Outra foi na universidade de Valencia. Nos juntamos a algumas no campus e comaçamos a nos masturbar (algumas nuas e outras não) em uma zona com muito movimento. Foi divertido porque a polícia da universidade chegou muito rápido e nós não paramos. Os guardas não sabiam o que fazer ou o que dizer, estavam totalmente transtornados. Muita gente que estava na biblioteca ao lado começaram a gravar com seus celulares. Também mostrar a masturbação feminina como algo público, quando a sociedade espera que ela seja feita apenas na vida privada, é algo muito terrorista. A pornografia comercial nega por completo o orgasmo feminino, ele não é necessário, é algo falso para divertir os homens. O porno terrorismo pretende mudar isso também com suas ações.


9) O bom humor faz parte das ações pornoterroristas? Por que?

É claro. Se não fosse divertido eu não faria. Porque nesta vida não deveriamos estar para sofrer, devemos mostrar que a sociedade nos faz sofrer muitas coisas, no meu caso com a sua obsessão com a manipulação do corpo e da sexualidade das pessoas. Agir de forma engraçada e com escárnio, é muito importante e interessante para as ações porno terrorista. Eu não acredito em revoluções sem humor.

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10) Qual a reação dos demais grupos que, teoricamente, tem os mesmos “inimigos” em comum com vocês mas apresentam um modo de ação mais conservador, por exemplo grupos antipornografia mais radicais?

Para mim não há “modo corservador de ação”, porque um dos meus objetivos precisamente é destruir esse conservadorismo. Os grupos anti-pornografia de 70-80 nos EUA (que se diziam ser feministas sem ser de verdade) preferiram se aliar com a direita e a igreja e com as demais feministas, então para mim todo o movimento proibicionista é o inimigo total, e não temos nada em comum.
E com muitos movimentos sociais com aqueles que eu tenho coisas em comum (por exemplo, anti-capitalismo) são gerados muitos conflitos, porque eles não são capazes de ver que a libertação física e sexual é uma prioridade para se engajar em qualquer luta. Como você pode enfrentar ao capitalismo a partir de um corpo totalmente financiado pelo machismo e hetero-patriarcado? Aqui em Barcelona conhecemos o caso de Zapatista que tentou estrupar uma garota, e eu posso concordar com as idéias Zapatista, mas se a pessoa que constrói essas ideias é machista e dominador, então é um inimigo também, embora quer algumas coisas como eu quero também.
Em geral os movimentos sociais não veem como algo importantes fazer primeiro a revolução corporal e sexual e veem esse tipo de política como algo secundário. Mas do meu ponto de vista uma pessoa que está presa a si mesma jamais poderá ser um agente válido para a libertação de nada; existe muitas prisões íntimas (heterossexualidade, amor romântico ou impenetrabilidade anal de homens, por exemplo) que deve ser derrubada antes de qualquer revolução.

11) Uma ação pornoterrorista pode provocar tesão nas pessoas? Ou deve ser agressiva e chocante?

Ele pode ser muito agressivo e violento, mas apenas para as pessoas que ainda pensam com um mente regulamentar, uma mente manipulada pelo sistema. É sempre doloroso ver que os padrões são uma forma de manipulação, especialmente se você acreditou nelas, se confiou nessas “grandes verdades” que te ensinaram desde que você nasceu. Eu acho que muitas pessoas defende essas ideias porque eles não podem mudar de idéia ou pensar de forma diferente da que eles foram instruídos a pensar. Essas pessoas são o foco principal do meu terrorismo, e se não for violento ou agressivo, não é terrorismo, é o diálogo, um diálogo que a sociedade tornou impossível.

12) Você faz parte de um coletivo que tem diversos artistas e que usam a pornografia em suas ações, você pode falar um pouco deste grupo? Quais os seus planos?

Aqui em Barcelona somos um grupo e nos dedicamos política e artísticamente as reinvidicações do pos-porno e feminismo pró-sexo, mas você não pode dizer que somos um coletivo, porque nós não trabalhamos juntas, mas focadas em um tema comum. Às vezes, há alianças e colaborações, e os nossos projetos se misturam, mas não temos nema estrutura e nem a ordem dos coletivos.
Podemos operar como uma “rede”, também com outras pessoas que não vivem em Barcelona, estabelecendo parcerias que são muito necessárias para nos fortalecer, é muito difícil às vezes para trabalhar em algo tão marginal assim, estar sozinho.
Nossos planos? Precisamente porque não funcionamos como um coletivo, eu não posso ser a porta-voz mais do que de mim mesmo. Meus planos são continuar a escrever livros que podem mudar a vida das pessoas e continuam a aterrorizar um sistema que, historicamente, tem se dedicado a aterrorizar as pessoas como eu, que não se encaixam em suas estruturas.

13) Existe algum país onde seja mais fácil fazer pornoterrorismo do que no resto do mundo?

Eu não sei. Eu acho que tudo é mais fácil na Europa, não? Embora também seja muito difícil, por exemplo, na Itália ou na Grécia, onde a sociedade tem uma repressão sexual e machismo muito mais enraizado do que na sociedade espanhola.
Eu ainda não tive a oportunidade de praticar pornoterrorismo em outros países fora da Europa.
E de qualquer maneira não é a facilidade do procedimento o que busca o pornoterrorismo, na verdade, eu acho que é necessário em qualquer lugar onde as pessoas não podem ser sexuais ou corporalmente livres, e esse é o mundo inteiro!


14) Quando começou e quais foram os precursores do pornoterrorismo?

Bem, eu comecei em 2006. O termo vem de um pouco mais cedo (2001), como explicado na resposta 1.
Pode-se dizer que eu sou a precursora, a inventora desse termo, tal qual está sendo usado agora, e até bem pouco tempo eu era a única pessoa que usava esse termo para denominar suas atividades políticas, artísticas e literárias.
Claro que tenho minhas referências que me inspiraram e me deram idéias que utilizo no pornoterrorismo, mas nenhuma dessas referências se consideram “pornoterrorista”. Spinkle Annie, Lydia Lunch, Ron Athey, Franco B, Virginie Despentes, A Teoria Queer, o movimento punk, e assim por diante.

15) Se nós gravarmos uma ação pornoterrorista e colocarmos em nosso site ela deixa de ser terrorista e passa a ser pornografia comercial? Quais os limites da comercialização de tudo na sua opinião e como protestar num cenário onde tudo pode estar a venda, inclusive os protestos mais legítimos?

Claro que não seria comercial. Porque eu não permitiria que meu trabalho seja vendido com as mecânicas da pornografia on-line (pay-per-view, assinatura e tudo isso). Uma das coisas que me incomoda é que a pornografia comercial não é facilmente acessível a todos, está fazendo uma discriminação de classe com o que não estou totalmente de acordo, principalmente porque eu pertenço a uma classe baixa.
Se gravam uma ação pornoterrorista e colocam em seu site para que apenas as pessoas que pagam possam ver, seria contraditório de minha parte, porque toda a minha obra está licenciada sob uma Creative Commons 3.0, que significa entre outras coisas “atribuição” (dizer o meu nome se você usar o meu trabalho) e “não-comercial” (ninguém pode ganhar dinheiro com o meu trabalho sem a minha permissão).
É muito pouco ético e pouco terrorista discriminar pessoas pelo dinheiro que elas têm em seu seu bolso. Eu faço muitas apresentações gratuitas durante todo o ano, o meu livro está à venda mas se alguém realmente não pode pagá-lo, eu envio sem nenhum custo.
Obviamente eu tenho que viver de algo, e o que eu faço também tem um preço, porque para fazê-lo eu utilizo todo o meu tempo (não tenho outro trabalho para me dar dinheiro, este é o meu trabalho, pornoterrorismo).
Acredito que só se pode falar em comércio, quando o fluxo de dinheiro e as estratégias são semelhantes aos do capitalismo, e não é o caso do meu trabalho.

16) Quais alvos podem ser atacados com mais eficácia por ações pornoterroristas, ou quais são os
principais alvos destas ações?

Eu amo essa questão, porque é simples de responder: tudo é atacável. Já que vivemos em constante opressão por regras, privação, manipulação e crimes (especialmente em torno de nossa sexualidade, nossa identidade e nossos desejos), praticamente qualquer ato de rebeldia contra essa opressão constante é um ato pornoterrorista. Meus inimigos pessoais são a Igreja, a ciência médica e o estado, mas também a ignorância a que esses três conduzem as pessoas.

17) Você consome pornografia comercial? O que mais gosta? Ou o que não gosta na pornografia comercial?

Sim, consumo pornografia comercial, há coisas que eu gosto. Eu amo a maioria das produções amadoras, esses vídeos que as pessoas fazem em casa são tão divertidos e sexy, às vezes. Isso me deixa muito excitada, o faça você mesmo, o mal feito, o que se faz sem muitos meios. Eu gosto de me masturbar com vídeos que as pessoas colocam na Internet (XTube, redtube, etc) de suas próprias masturbações. Claro que na verdade isso não é muito comercial.
No que é considerado “comercial” eu gosto de Belladonna, porque ela é uma infiltrada, faz coisas que normalmente não são vistas na pornografia comercial, ela é um monstro espetacular, um vírus no sistema. Também gosto de Cytherea, pelo seus “squirtings” que são como fontes infinitas e porque mostra que as mulheres podem ter ejaculações muito mais escandalosas do que a ejaculação dos homens.

Eu amo todas as produções Kink, especialmente aqueles de Wired Pussy, porque acredito que tratar as práticas sadomasoquistas dessa forma, ajuda a retirar seu caráter de patologia, realmente ajuda a torná-lo um jogo, e também dizer que o poder é um brinquedo, como o sistema de recompensas e punições que nossos governos usam para nos manter calados.

O que eu não gosto na pornografia comercial é que ela tenha sido usada durante muito tempo como arma pedagógica, para ensinar as pessoas como foder e com quem foder, que corpos são desejáveis e que corpos não são, gerando muita frustração pela incapacidade da maioria das pessoas de ajustar suas realidades sexuais ao tipo de ficção e exagero que a pornografia comercial vende e incentiva.
O pior da pornografia comercial não é que ela venda e gera dinheiro, por princípio isso não teria nada de errado. O pior é que para poder ser vendida ela tem que se ajustar a regras castrantes, machistas e capitalistas. Por exemplo, uma produtora porno que se arrisca com um filme em que mostre uma mulher penetrando um homem, porque a maioria das distribuidoras se negam a mostrar esse material. Isso não é arbritário, é mais uma estratégia para reduzir o poder das mulheres e a liberdade dos homens, é uma estratégia de merda.

18) Conte-nos sobre a sua formação, explicando como foi seu primeiro contato com a pornografia eo terrorismo. Quem inventou o termo “pornoterrorismo quais são as principais causas movimento pornoterrorista?

Minha formação? Se se refere a minha formação acadêmica ela não tem quase nada a ver com o que estou fazendo, eu estudei Filología hispânica. Minha verdadeira formação não é muito acadêmica, está muito ligada às minhas próprias experiências em um mundo que trata com violência tudo o que desvia das regras estabelecidas. Minha formação é de guerrilheira-pós-pornô-queer.
Meu primeiro contato com a pornografia não consigo me lembrar, porque a pornografia está em toda parte desde o nosso nascimento, se considerarmos que a definição de pornografia é a representação de sexo, não podemos negar que essa representação é uma das favoritas para humanidade. Sempre, desde a infância, eu tinha ao meu alcançe revistas pornográficas, na minha casa a sexualidade nunca foi um tabu. Com o terrorismo a mesma coisa: o terrorismo do Estado, da Igreja, da medicina que são sistematicamente aplicadas desde o início de nossas vidas. Minha forma de terrorismo é uma resposta a isto.
O termo “pornoterrorismo” surgiu em um brain storming em 2000 com o meu antigo grupo de performance, mas era uma palavra mais para escandalizar do que qualquer outra coisa. Nos 6 anos que tenho utilizado o termo para descrever meu trabalho ele tem se politizada e desenvolvido bastante.
Para mim trata-se de uma forma de expressão político-artística-belíca que surge como resposta diante à impossibilidade de diálogo com um sistema profundamente sexófobo, machista, heterossexista, capitalista e doente.

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19) Que fontes você indica para quem quer se aprofundar no assunto? (livros, sites, filmes e etc)

Copio aqui um fragmento do meu livro em que eu cito minhas referências, espero que ajude. Existem também algumas fontes que eu pessoalmente não li e não inclui nesta lista, mas que são importantes para compreender estas idéias: Judith Butler, Donna Haraway, Judith Halberstam, e assim por diante.

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