Neste episódio Nicole Puzzi entrevista Fernanda Pessoa, artista visual. No episódio 4 da terceira temporada de Pornolândia elas conversam sobre a censura da Pornochanchada, os pareceres dos censores e a exposição que traz a experiência empírica dessa época. Uma conversa explícita que você poderá ler na transcrição a seguir, ou assistir diretamente no Canal Brasil na Globoplay.
Nicole Puzzi: Hoje eu estou me sentindo em casa! Estou no Museu da Imagem e do som e vim conhecer a vídeo-instalação “Prazeres proibidos”. É uma mostra que fala do encontro da censura com a Pornochanchada. A responsável por essa exposição é a cineasta Fernanda Pessoa, uma mulher inteligentíssima, talentosa e linda. Vamos falar dos grandes nomes de uma época muito importante do cinema brasileiro e entender que, por trás da nudez, existiam mensagens políticas e muita crítica social. E, sem censura nenhuma, vem a nossa xgirl encerrar a noite com a gente!
As produções de Fernanda Pessoa
Fernanda, você tem uma formação em cinema, né? Ah, mas antes disso, você é tão bonita!
Fernanda Pessoa: Ah, obrigada! Vindo de você isso, é um elogio incrível.
NP: Eu sou gostosa para a idade, eu já sei. Mas, eu queria saber um pouco mais sobre os seus estudos, as obras que você já produziu.
Fernanda Pessoa: Então, eu sou formada em cinema pela FAAP e tenho mestrado em cinema também, pela Universidade de Sorbonne, na França. Eu estudei com o Philippe Dubois, que é um cara muito legal de cinema experimental, cinema de exposição. Morei lá durante dois anos, fiz alguns filmes na FAAP e fiz alguns lá também, fiz alguns curtas. Eu trabalho muito nesse limite entre o cinema e as artes visuais. Então, eu tenho um trabalho de filmes, mas eu também tenh um trabalho expositivo, muito com película. Eu adoro trabalhar com película, gosto muito dessas coisas bem antigas, tipo Pornochanchada.
NP: Tipo Nicole!
FP: Nicole, Pornochanchada, Película, que é uma coisa que está morrendo hoje em dia. Então, eu tenho muito interesse pelo cinema dos anos 70/80.
Censores: Burros?
NP: Você acha que os censores sabiam essa diferença entre pornochanchada e um filme de entretenimento? Eu tenho minha opinião: eu acho que eles eram burros!
FP: Acho que eles… Lendo os pareceres, porque eu li muitos pareceres, li mais de 400 pareceres assim, eles sabiam… Sempre que era uma Pornochanchada eles escreviam “pornochanchada nacuional, comédia” ou eles chamavam de subgêneros assim “pornossocial, pornopolítico” tudo porno. Então, eles tinham essa classificação que eles faziam. Os pareceres eram bem específicos assim, na classificação você vê que tem questionários, tinha que colocar qual era a mensagem, qual era o teor, tinha que fazer uma descrição dos personagens. É super específico. E os censores tinham aulas de técnicas cinematográficas.
NP: Tinha mulher que comandava a censura, né! Era uma mulher, né?
FP: Eram sempre três censores que viam os filmes. E tem hora que você consegue ver a personalidade dos censores, né! Você vê que cada um tem um tipo de escrita, cada um escreve de um certo jeito, tem um que se incomoda mais com palavrões, tem um que se incomoda mais com cena de sexo, tem um que se incomoda mais com mulher pelada. Então, cada um tem a sua particularidade também, isso é muito interessante, você começa a fazer um perfil psicológico dos censores.
NP: Em 1984, eu fiz uma novela chamada “Transas e caretas” e eu tinha uma cena de beijos com o José Wilker. Eu estava saindo da Pornochanchada e aquela cena ficou bastante sensual. Os censores cortar porque a Nicole Puzzi era muito sensual. Então tá, né. Mas dei uns beijos no José Wilker que, na época, estava bonitinho.
FP: Um elogio né, foi cortada porque você é muito sensual.
NP: Foi bem isso! E o que você anda produzindo além da exposição? Belíssima exposição, por sinal.
Projetos de Fernanda Pessoa além da exposição
FP: Então, a exposição é, como eu estava falando, um desdobramento desse meu longa, que é um longa que eu estou fazendo há mais de 4 anos, estou pesquisando ele. Chama “Histórias que o nosso cinema não contava”.
NP: Legal, bom nome!
FP: É uma brincadeira com “Histórias que nossas babás não contavam”. É uma releitura dos filmes dos anos 70, a partir da pornochanchada. Então, eu selecionei 30 filmes e é um filme de montagem. Não tem entrevista, não tem voz off, não tem imagens atuais. É tudo filmes que, na época, foram chamados de Pornochanchada, que eram os filmes mais produzidos e vistos da época. Tentando encontrar o que esses filmes têm de histórico neles. Então, eu não estou só falando de sexo, de liberação feminina, estou falando de milagre econômico, indústria cultural, um monte de coisa.
NP: Moda também!
FP: Moda também, exatamente! Estou fazendo um grande retrato dos anos 70 só com esses filmes. Eu procurei o que esses filmes podem nos contar sobre essa época.
A montagem da exposição de Fernanda Pessoa
NP: Como foi a montagem dessa exposição?
FP: Então, essa exposição foi o seguinte: eu estava fazendo esse meu longa que estou terminando agora e comecei a pesquisar a questão da censura. Comecei a ler documentos da censura, pareceres da censura e descobri que a pornochanchada era muito censurada.
NP: Era, era!
FP: O censo comum acha que não!
NP: As pessoas desinformadas, aí você me desculpe, mas eu tenho que dar o meu palpite.
FP: Claro.
NP: As pessoas mal informadas acham que a pornochanchada era querida pela ditadura. Não é verdade. A pornochanchada não era patrocinada pela embrafilme.
Experiência empírica
FP: Então, eu estava fazendo essa pesquisa e eu fui selecionada para fazer uma residência aqui no MIS, que é o NECMIS, uma residência super legal que dura um ano. E eu fui selecionada com esse projeto já, para falar da censura aos filmes de pornochanchada. Então, durante um ano eu fiquei aqui pesquisando, tanto a parte teórica, porque tem essa questão prático-teórica. Me deu essa chance de me aprofundar nessa questão da censura e ai eu decidi…
Eu já entrei querendo fazer uma vídeo-instalação. Eu não queria fazer um filme, também não queria fazer uma produção teórica que você lê e depois… quem vai ler? Eu queria alguma coisa que a pessoa tivesse essa experiência, que ela entra e pode se sentir em uma repartição pública da censura. Tinha muito dessa coisa de ter uma experiência empírica para o expectador. Então, depois desse tempo que eu fiquei fazendo residência, eu decidi fazer essa intalação que são três ambientes. No primeiro ambiente, tem um projetor em película que roda sem nada, imagem em branco. Um segundo ambiente que tem os documentos de censura, porque eu acho esses documento incríveis, não sei se você chegou a ver algum.
NP: Vi na época, assim, ao vivo.
FP: Esses documento são muito impressionantes, eu queria trazer à luz, Porque, hoje em dia, é muito fácil acessar eles, você vai no arquivo nacional, é super fácil. Eu tentei achar alguns de filmes seus. Eu procurei e achei alguns pareceres sobre o “Possuídas pelo Pecado”. Eles não foram censurados porque eles acharam de leve, eles acharam “Possuídas pelo pecado” leve, então tudo bem, discreto. As cenas de sexo eram discretas, então tudo bem.
Em nome da cambada
NP: Fernanda, eu quero te agradecer por esse resgate, mais um resgate sério da pornochanchada. Não é simplesmente falar da atriz ou do diretor, mas ter uma visão diferenciada da pornochanchada através da ditadura. E quero agradecer pela belíssima exposição sobre a pornochanchada, por essa tua visão que eu estou achando maravilhosa. Então, em nome da cambada de pornochanchada, eu te agradeço!
FP: Obrigada, eu que agradeço a você por terem feito esse cinema incrível que me motivou a fazer muita coisa. Me inspirou muito!
NP: Ai, eu toda metida falo: não foi para qualquer um viver os anos 70 e fazer pornochanchada.
FP: Com certeza!
NP: Agora vamos ver a xgirl!
FP: Vamos!
A nossa Xgirl
E o programa terminou com a maravilhosa Xgirl Angel, uma loira maravilhosa, que ficou nua em um ensaio sensual que vai te deixar louco só de olhar.