Clara Averbuck no Pornolândia

Neste episódio Nicole Puzzi entrevista Clara Averbuck, uma escritora feminista que gerou polêmica. No episódio 9 da quinta temporada de Pornolândia elas conversam sobre o machismo estrutural, liberdade, assédio e como o feminismo tem contribuído para as mulheres. Uma conversa empoderada que você poderá ler na transcrição a seguir, ou assistir diretamente no Canal Brasil na Globoplay.

Clara Averbuck abraçada com Nicole Puzzi

Nicole Puzzi: Ela escreve, canta, já participou de programas de tv e teve seus textos adaptados para o cinema. É uma mulher cheia de talentos. Clara Averbuck vai conversar com a gente sobre um tema polêmico: feminismo e sexo. E a sempre erótica e poderosa xgirl encerra nosso programa de hoje.

Ser mulher

Clara, ser mulher hoje é muito diferente do que era ser mulher na sua época, a época que você começou a escrever?

Clara Averbuck: É e não é. É, porque eu vejo que as mulheres têm mais noção do que é… do espaço, do lugar que a gente pode ocupar. Mas, ao mesmo tempo, os estímulos que chegam para a gente, seguem sendo os mesmos. Então, de questões tipo machismo, de, basicamente a forma como a sociedade nos trata.

NP: E você fala em machismo, nós mulheres quando falamos em machismo parece que estamos cometendo um pecado mortal diante dos homens.

Clara Averbuck: É, então eles que se acostumem, porque nós vamos continuar falando muito disso.

O machismo estrutural

NP: Muitos entendem, a gente tem que ser verdadeira. Mas tem uns que já chamam de feminazi, de lésbica…

CA: Todos os dias eu escuto isso. Todos os dias da minha vida tem alguém me xingando, mandando eu arrumar um homem de verdade e formar uma família, parar de ser feminazi, essas coisas assim. Nessa época que eu comecei a escrever, eu mesma não tinha essa noção do que era feminismo, mas eu já era feminista.

Claro que eu tinha algumas atitudes machistas, porque o machismo é anterior a nós. Então a gente cresce nessa lógica, mesmo que sejamos mulheres mais livres, com o pensamento mais libertário assim, a gente tá dentro de uma estrutura que a gente acaba reproduzindo o machismo. Então, nessa época que eu comecei a escrever, eu mesma reproduzia também, por mais que eu fosse uma mulher independente, que buscasse individualidade, saindo do espaço reservado para as mulheres que escrevem. Porque, ou você escreve aquela coisa da literatura erótica, aquela coisa do véu de mistério, não é putaria, né. E eu comecei a escrever putaria, sexo no meu livro.

As pessoas ficaram muito chocadas e eu fiquei chocada porque as pessoas ficaram chocadas. Porque pra mim… pô, os caras que eu leio também escrevem assim, eu tenho essa referência pensando nos escritores que eu lia na época, na época não tinha nenhuma mulher, mas eu não pensava em gênero nessa época. Então, quando eu escrevi e publiquei, como é que pode as pessoas em 2002, que foi quando lançou, ficarem escandalizadas com sexo, boquete, com cu, gente.

A maternidade

NP: Aí você se tornou mãe. Isso te ensinou alguma coisa sobre esse universo sobre a mulher, sobre você? o Ser mulher?

CA: Já na gravidez me ensinou que as pessoas vão dar pitaco na sua vida. Aliás, quando você está grávida, seu corpo deixa de ser seu e vira de todo mundo, né. Não só na gravidez, né, porque as pessoas acham que o corpo da mulher é público, que pode se opinar, que pode até tocar.

A grávida é complicado, o que tem de gente enfiando a mão na tua barriga e essas coisas assim. Então, na gravidez já fiquei achando essas coisas assim, que coisa esquisita… aí nasce um filho e comecei a ter um pensamento mais pra esse lado. Foi mais pra agora que eu tô com uma filha adolescente que eu comecei a aprender mais.

NP: Falando da sua filha adolescente, qual é a diferença entre os reflexos positivos da geração da tua filha e os amigos da tua filha e  a geração da sua época?

CA: Minha filha só tem amigo gay, felizmente. Porque eu fico pensando e fico muito mais tranquila com ela andando com um grupo de meninos gays do que um grupo de héteros. O que acontece é que as meninas estão sendo criadas de uma forma diferente, estão tendo outras noções, outras… a gente vê essa geração, que tem vinte anos agora, elas já têm uma noção de si que eu não tinha, você não tinha nessa época.

Assédio em diferentes épocas

NP: Magina, eu sou da geração 70. Na minha época, não existia esse perigo, vamos dizer assim. Claro, sempre teve assédio, mas assim, não era tão perigoso como hoje. Eu não entendo.

CA: Eu não sei se a gente se coloca de uma forma também que parece que não era perigoso, colocava de uma forma que né… se impor de uma forma. Ou se hoje tem mais denúncia e as meninas estão sabendo melhor o que é abuso, assédio, do que é consentimento.

As pessoas precisam entender uma coisa: o assédio e o flerte são coisas completamente diferentes. E o que separa essas coisas é o consentimento, é a reciprocidade. Assédio é quando a mulher não está respondendo aquilo. E se o cara não tá sabendo ler isso “aí, mas eu achava que ela tava querendo”, primeiro que ele é um idiota.

NP: Ou é idiota ou é uma pessoa que tá mentindo…

CA: Ou mentindo ou cego pela posição de poder de achar que todo mundo que está ali quer dar pra ele, porque ele tá ali e ele pode. Isso também é uma construção do macho, do homem, que tem que mudar. E que, se tiver que mudar sob coerção, digamos assim, que seja então. Porque tem isso “ah., os homens vão ficar com medo das feministas”, gente.

Nicole Puzzi a frente, com o foco da câmera nela. Atrás, Clara Averbuck.

O feminismo para todas

NP: Você acha que o feminismo também se aplica no caso de mulheres trans?

CA: Claro, tem que se aplicar. Por mais que elas tenham outras demandas, outras questões e uma busca por direitos muito precária ainda, porque o Brasil é o país que mais mata travestis e trans no mundo, então elas estão na luta pela vida. É uma coisa absurda quando você vê os dados de violência, então como que o feminismo não vai abarcar essa questão? São demandas específicas, a gente tem assim… o feminismo tem que abarcar todas as mulheres.

NP: Antes de falar dos seus projetos atuais, eu só vou citar uma coisa que eu já falei outras vezes aqui. Quando eu fiz Ariela, quem escreveu foi Cassandra Rios, a autora mais discriminada do nosso país. Se ela fosse homem, ela seria o Nelson Rodrigues. Ela era mulher e lésbica e ninguém perdoou. Mas eu acho que isso vem ao encontro com o que você vem lutando, com a sua luta de hoje.

CA: Com certeza!

NP: Com essa luta toda que as mulheres que as mulheres estão querendo educar um pouquinho mais os homens.

CA: A Cassandra em especial, que foi apagada da literatura muito por ser lésbica.

NP: Por ela ser lésbica.

CA: Por ela ser lésbica… é muito absurdo isso.

NP: Puro machismo, né.

CA: Escrever é quase como abrir as pernas, sempre estão mandando a gente fechar. “Fecha essa perna menina”, não fecho.

Os projetos de Clara Aberbuck

NP: Pronto, pronto, também abri. Vamos abrir as pernas. Queria saber dos teus projetos atuais e como as pessoas fazer para encontrar as suas obras, entrar no seu site.

CA: O meu site é Claraaverbuck.com. Lá tem as oficinas que eu dou, as palestras que eu vou dar nos lugares, as viagens que eu tenho marcadas, essas coisas, debates. Eu tô escrevendo dois livros agora. Um, na verdade eu não tô escrevendo, já está escrito, um livro de crônicas que eu publiquei no jornal que eu escrevo, o Zero Hora, de Porto Alegre e na Marie Claire, que eu sou colunista. Já era pra ter saído na verdade esse livro, ele tá um pouco atrasado. Mas ele vai sair em breve.

Vai ser um livrinho bem bacana assim, bem didático, sobre a nossa vivência, a vivência de outras mulheres. Questões básicas do feminismo assim, para pessoas… quase um feminismo para leigos. O que que é? Como? Porque? Como surgiu? Que que vocês querem, vocês já não tem tudo? Não, a gente não tem!N

NP: Querida, muito obrigada.

CA: Obrigada pelo convite.

NP: Foi o maior prazer ter você aqui.

CA: Foi muito legal. Muito obrigada!

NP: E agora nós vamos para a nossa xgirl.

A nossa Xgirl

Xgirl Carol Pascon totalmente nua

E o programa terminou com a maravilhosa xgirl Carol Pascon, uma morena muito sensual, que ficou nua em um ensaio na sauna. É de aumentar a temperatura…